Num voo clandestino, com os pés presos ao chão da minha varanda, meu espírito desconhece essas leis da física. Meu corpo é pequeno. Usurfrindo da força de um segredo das trevas e da luz, da noite e do dia, numa linha de segundos que une tais forças opostas, eu me elevo no ar, e tento decifrar os vocábulos do céu. Mas eu desaprendi a língua do céu. Leve, permaneço a flutuar dentre as palavras chovidas apenas a mim, em anagramas e hieróglifos de outra era e outro espaço. Minh’alma como um livro a ser escrito, não apagou com o devido sucesso passagens de um outro tempo anterior à minha carne atual, deixando rastro do grafite apagado. E lá estava escrito que eu voei, suave como um acorde de violino, eu brincava com o céu e ele brincava comigo. Enquanto hoje, meus olhos cansados de uma curta vida continuam empurrando um entulho que se aglomera conforme os passos, que se materializa a cada expiração e que me faz penar no gosto azedo de algo que, em teoria, era para ser agridoce. Para deixar em pratos limpos, há alguns passos atrás, perdidos no espaço-tempo, eu estava triste. A chuva costuma cair espessa, à toneladas, em minhas costas desde que era criança. Eu suporto o peso do mundo inteiro, sem ajuda alguma. Então, o céu me alivia ao amanhecer; no contorno das núvens, eu me embebedo da alvorada. Não falo mais a língua do céu por que agora eu sei mergulhar. Agora que já não tenho mais corpo para ser celeste, só resta aos meus olhos ensopados a prerrogativa de saber como é estar envolto da glória absoluta antes de deitar-me, para então, pedir por um sono tranquilo.
sexta-feira, 30 de dezembro de 2011
sábado, 17 de dezembro de 2011
Por mais.
Ao dia, meu andar imponente, minha cabeça erguida e o olhar embebecido com doses extras de prepotência me mantém seguro por longas horas a fio, sem que eu saia de um modo automático e pare de fingir que sou extremamente forte. Entretanto, à noite, o senhor Medo me ajuda a tirar a armadura; enquanto assisto à minha pele perecer como areia, lá fora troveja, forte, e o frio pede passagem. Sou educado e abro a janela. E continuo a jornada pelos quatro infinitos metros quadrados de um quarto molhado por minha transpiração excessiva e diária; ainda o sinto seco e infértil, padecido na maldição de me velar desmoronar um pouco a cada dia, e sob seus olhos mortos e atentos, me atenho à uma posição fetal, numa vaga tentativa de me sentir menos triste, menos sozinho.
Não me atreveria a pedir um abraço...
... por mais que precisasse.
Não me atreveria a pedir um abraço...
... por mais que precisasse.
sábado, 10 de dezembro de 2011
Cavaleiro.
Meus pés, incrivelmente, não reclamaram ao atingir o chão frio pela manhã, que estava cinzenta, assim com eu. Desenhei com o dedo os contornos do meu rosto no espelho; talvez fosse um mapa, ou até, possivelmente, já tivesse encontrado o que tanto temi achar. Mais um sonho que tive, e mais uma vez, vieste num cinismo sutil invadir a mais privada das propriedades. O sagrado do meu sono foi roubado, e tua presença profana ousou me perturbar, e a audácia de me lembrar o que eu tinha jogado aos ventos do norte, na esperança de nunca ter que encarar novamente. Tu vieste esfregar à minha cara. Vieste zombar de mim. Zombar de minha falsa-prepotência. Ela, sim, caiu por terra com a tua estadia inconveniente. Viste a tua superioridade fria e egocêntrica, comparada a minha fragilidade desarmada.
Pelas tuas risadas, eu te expulsei. De novo. Há uma faixa de ‘Proibida A Tua Entrada’ na porta, em tom de pixe vermelho, letras grandes. A chave, sabe lá Deus onde caiu. Porém, antes de deitar esta noite, perguntarei ao espelho, exijindo respostas; quero uma expressão matemática, num papelzinho qualquer – pode ser amassado –, para domar o que em meu peito insiste em te cultivar, torna-lo-ei corcel, colocar-lhe-ei arreios e ensinar-lhe-ei o trote.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
quarta-feira, 7 de dezembro de 2011
Eu te chamo Covarde.
Enquanto me amaldiçoas pelo espelho que sou, eu zombo da tua cara infame de menina moça.
A hipocrisia que te recheia os olhos ao me olhar, não me esconde o medo que te causo.
Pela linha retinha de uma vida quadrada que lutas para manter, vais entocando os teus erros passados com jeito malandro.
Numa surdina matinal, varres este chão esburacado e ponhe-lhe um tapete felpudo, branco e puro.
Tua face é fachada montada, que levas para todo o lugar; que usas para adorar; que te nega o peso dos teus erros e te mantem a salvo de Alecto.
Enquanto eu celebro minha natureza com alegria, tu a vees como ameaça.
Ameaça à reta que te prestas a seguir, cega, aderindo às convenções e fugindo das fraquesas.
Por isso, pagas-me com um sorriso maldito e aguardas o meu descanço com um punhal entre os mesmos dedos que alisam os meus cabelos.
Enquanto meu sono tranquilo inflama os sentimentos verdadeiros, tu os desfazes.
Não importa, pois de uma ratasana amedrontada tu não passas. Assim como a bruxa velha que te guia.
De mim, não terás nada além da pena e a palavra "Covarde" aos lábios.
Eu te chamo Covarde.
segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
Há certas noites que gritos de saudade ficam presos entre o controle e a loucura. Se eu me calei, foi a coação do medo de ser tido como louco. Mas, levando em consideração à insanidade de continuar os passos arranhando o chão que piso, suplicando aos céus um toque que seja, começo a me perguntar o que é loucura, afinal...
quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
Eu afirmo, chamo-me Ganímedes.
À minha infância, fiz planos,
Ao resto, os refiz.
Eu sonhei, sim, com uma força acima do normal,
Desejei também os resultados,
Eles não vieram, sabe?
A caminhada acabara por me revelar tantas outras,
Descobri que minhas pernas não são tão resistentes
E que a subida é árdua demais,
E além do que, descobri que não sou divindade,
E sim, mais um de carne e osso a compor a multidão.
Faz diferença?
Talvez...
Deparei-me com os materiais do pôr-do-sol,
E com borboletas, já secas, em decorações sem bom-gosto,
"O amor não é absoluto, temos que o fazer crescer por entre as rachaduras"
Expremi de algum lugar, quiçá agora mesmo.
Certa vez ouvi o "amargo" me nomear,
Não os culpo, a vida clama pelo verde,
Mas para quem atravessou um mar de pedras a nado nu,
E deixou para trás aquela pasta de desenhos no meio do nada,
O amargo não seja tão ruim, afinal ainda há um sabor ao chegar às rochas,
Sabor este que me baba a pele nua, ao redescobrir minha própria nudez.
Dentre os meus traços exacerbadamente humanizados, há um bicho.
Eu afirmo, chamo-me Ganímedes,
E chegando onde hoje estou, aguardo de bom grado as garras da águia.
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