Era manhã de domingo. Estava frio, tanto fora quanto dentro.
A cidade dormia e eu, ainda acordado, contava as bolhas de fumaça que saíam da
quarta ou quinta xícara de café que acabara de fazer. Naquele domingo, eu
estava um ano mais velho. Desliguei tudo o que me conectava ao mundo, acendi um
baseado sem medo e contemplei o céu que despertava. Sozinho, como sempre estive
nesses vinte e cinco longos anos, me despi em frente ao espelho. Poderia
enumerar mil e um defeitos, mesmo tendo conquistado o corpo que sonhei, mas
não, apenas quis me ver completo, sem pretensão lógica alguma. Meu corpo, assim
como minha vida, sentiu a frieza de existir e a solidão de continuar. Estava
frio, minha pele arrepiava. Estava frio, meus pulmões adormeceram. A fumaça,
costumeiramente amarga, se fez doce. A costumeira euforia deu lugar à retenção.
E eu procurava a cada canto algo que delatasse a poesia que perdi. A vida
mostrou-se uma verdadeira droga! E o céu, acima, pintava minha verdade triste
com suas cores mornas, com uma saudade que nunca consegui suprir, enquanto o
dia se fazia lá embaixo. Apenas ouvia os carros. Alí, tudo pedia um soundtrack,
uma melodia de tema. Mas não, apenas quis ouvir o dia monótono que estava por
vir. O apartamento, então pequeno, agigantou, bem como em todos os dias que a
solidão vinha fazer sala. Nessas horas de sobra de reflexão, me peguei traçando
o gráfico da minha caminhada. Mais parecia uma função do segundo grau, em que o
ponto máximo era exatamente aquele dia, meus vinte e cinco. A partir dali, tudo
seria decrescente. Ao que dizem, a queda é mais rápida que a subida. Interessante
que bem no parabéns renegado e no feliz aniversário que rejeitei, eu estaria
entre os planos da vida em diante, dos dias após os vinte e cinco. Logo
chegaria os vinte-e-cinco-e-um-dia, e tudo seria decrescente. Muito sempre me admirou
o festejo tão intenso e fanático à vida que pessoas comuns se prestam a vida
inteira. Às vezes penso ser uma auto compensação às frustrações que se acumulam
pouco a pouco e, no fim, o prazer real vai ficando escasso. Eu já não me dou essa prerrogativa. Aliás, a única prerrogativa que me dei àquele dia foram o café morno e o baseado. E o barulho dos carros e dos meus pensamentos. Mas, principalmente, a luz branda do Sol que levantava, que em muito se assemelhava às manhãs da minha infância. Àquele dia, estava numa montanha russa, de mãos levantadas, preparadas para a descida. Porém, sem sustos ou solavancos, apenas a leve ansiedade para que tudo acabasse.