terça-feira, 21 de setembro de 2010

Companhias Inevitáveis.

 

Os brinquedos estavam espalhados pelo jardim, onde Daniel sempre adorou brincar com seu irmão mais velho. Corria pela casa, transmitindo toda a alegria de uma criança saudável. Por ser o caçula, tinha um pouco mais da atenção dos pais. Desde pequeno estava sempre aplicado nos estudos. Sua vida era confortável, já que seus pais eram empresários bem-sucedidos. Tinha os brinquedos que queria, na hora em que queria. A infância deste garoto foi tranquila, tendo em vista todos os mimos que lhes eram dados sem o menor esforço, a não ser, os estudos.
Ao entrar na adolescência, lá pelos seus treze anos, começou a perceber que algo havia de errado com ele: Sentia atração pelos rapazes. Entrou em conflito consigo mesmo durante um tempo. Achava que aquilo iria passar e que iria terminar casado e com muitos filhos. Foi aí que Lucas apareceu. Dezesseis anos, corpo atlético e boa pinta. Todas as meninas da escola afim dele e ele exercia certa atração em Daniel. O observava nas aulas de educação física e pensava nele à noite antes de dormir. Lembrava do seu corpo suado, aqueles músculos em movimento e no seu cheiro. Assustava-se com tudo aquilo, não era normal. Num acaso do destino, acabaram se conhecendo e em pouco tempo viraram grandes amigos. Daniel nunca teve coragem de contar sobre tudo o que sentia e nem desconfiava que Lucas já havia percebido seus olhares. Bastou Daniel ir dormir na casa de Lucas e pronto, foi apresentado a Luxúria: Uma mulher bela, de curvas pefeitas que carregava a sensualidade no ser. Deleitou-se com tudo o que a bela mulher o dizia para fazer, e com Lucas, teve uma noite de descobertas e muito prazer.
 Apartir daquele instante, a Luxúria foi sua companheira fiel de bons momentos. Sempre ficava atento ao que ela lhe falava. Dado que, em certas ocasiões, ela atrapalhava sua vida, mas sua companhia era satisfatória. Alguns amores rompidos por causa de traições que ela insistia em lhe proporcionar não eram nada diante de todo o bem que ela lhe fazia. Aos vinte anos, ela já lhe ensinara tudo sobre a arte da conquista. Disse-lhe para entrar numa academia e assim chamar mais a atenção dos rapazes. Com o tempo aprendeu sobre moda e penteados e a uma prima da Luxúria foi apresentado: Vaidade. Uma mulher extremamente magra e cheia de si. Soberba e esnobe, andava olhando pra tudo de cima. Com o tempo, também passou a escutar seus conselhos. Essas duas o acompanhavam por onde ele ia. Eram inseparáveis.
Daniel estava com vinte e cinco anos. No auge de sua beleza e popularidade. Onde quer que chegasse, nunca estava só, sempre na compainha de belos rapazes. Era o tipo de cara que chama a atenção de longe. Noitadas, festas e orgias, não tinha do que reclamar. Tinha um bom emprego e uma bela casa e a luxúria como dama de companhia. Desenvolveu uma ninfomania. Todos os dias ele bebia o líquido que saída da boca da bela mulher, obedecendo seus mandamentos. Cada noitada, um cara diferente. Mas ele não se descuidava. Ah, isso que não! Sabia o que essa vida acarretava e se cuidava muito bem, assim, poderia aproveitar até a última gota do que a vida lhe proporcionava de bom.
Aos trinta e dois, já estava estabilizado na vida. Tinha dois carros na garagem, uma cobertura à beira-mar e uma casa confortável num dos melhores bairros da cidade. Sentia-se meio só às vezes, mas era coisa passageira. Sua vida agitada, fazia com que sempre tivesse companhias. Com o tempo, sentiu seus amigos um tanto afastados. Ou tinham ido embora, ou estavam namorando, ou atolados pelo trabalho. Suas únicas companhias acabavam sendo as pessoas com quem ele transava. A empresa que abrira a dois anos estava rendendo bons frutos. E a Luxúria e a Vaidade continuavam firmes e fortes do seu lado. Continuava muito belo e vaidoso. Sempre chamando a atenção dos garotões. Aos trinta e sete, as festas já não tinham tanto gosto assim, preferia um cineminha e barzinhos, sem deixar a de seder a Luxúria, claro.
Pouco depois de fazer quarenta e três anos, sua empresa entrou em crise, teve que diminuir o número de funcionáros e de produção. Vendeu os carros e a casa que tinha. Comprou um carro popular e passou a morar na cobertura que lhe restara. Viu que depois disso, grande parte dos amigos que tinha se afastaram. Passou a se afogar  no trabalho para esquecer a imensidão da casa que o esperava todas as noites. Aos poucos, percebeu que a Luxúria tinha se afastado, ele já não tinha o mesmo corpo e o fogo de antes. Estava quase falido e não exercia o mesmo facínio nas outras pessoas. Ele já não servia mais. Mas, não sabia ele, que antes de ir, ela o deixou aos cuidados da irmã, a Solidão, que chegara na fase dos trinta anos, sem que ele percebesse. Uma velha decrépta, fedorenta e incrívelmente chata. Passava o tempo sentada numa cadeira de balanço, se lamuriando e resmungando sobre como tudo seria se tivesse tomado as escolhas certas. Daniel não gostava, não gostava mesmo da Solidão. Passou a chorar com mais frequência.
Chegando aos cinquenta e cinco, já se via sem esperança alguma. Não se olhava mais no espelho e hora ou outra fitava o telefone, esperançoso por uma chamada. Não tinha amigos e apenas um irmão se preocupava em mandar e-mail uma vez por mês. Um choro meloso de criança começou a ouvir dia e noite. Era a Depressão, que agora estava sentada no colo da Solidão. Uma menina que derramava lágrimas sem cessar. E Daniel não gostou daquela menina, mas não podia fazer nada. Andava pela casa, ouvindo aquele choro baixinho, tentando desesperadamente se distrair com alguma coisa, mas essas compainhas não o perdiam de vista Sua existência não tinha mais significado, sempre achou que nunca iria envelhecer. Aquelas duas acabaram por tomar conta de sua vida. Afogou-se no álcool e, alguns anos depois do falecimento repentino do seu irmão, morreu de cirrose hepática, tendo como únicas testemunhas em seu leito de morte, a velha decrépta e a criança de choro meloso.

Um comentário:

  1. Lamentável. Muitos no que hoje estão no topo da juventude não conseguem ver o fim que os aguardam. Triste... triste....

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