sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Decrescente.



Era manhã de domingo. Estava frio, tanto fora quanto dentro. A cidade dormia e eu, ainda acordado, contava as bolhas de fumaça que saíam da quarta ou quinta xícara de café que acabara de fazer. Naquele domingo, eu estava um ano mais velho. Desliguei tudo o que me conectava ao mundo, acendi um baseado sem medo e contemplei o céu que despertava. Sozinho, como sempre estive nesses vinte e cinco longos anos, me despi em frente ao espelho. Poderia enumerar mil e um defeitos, mesmo tendo conquistado o corpo que sonhei, mas não, apenas quis me ver completo, sem pretensão lógica alguma. Meu corpo, assim como minha vida, sentiu a frieza de existir e a solidão de continuar. Estava frio, minha pele arrepiava. Estava frio, meus pulmões adormeceram. A fumaça, costumeiramente amarga, se fez doce. A costumeira euforia deu lugar à retenção. E eu procurava a cada canto algo que delatasse a poesia que perdi. A vida mostrou-se uma verdadeira droga! E o céu, acima, pintava minha verdade triste com suas cores mornas, com uma saudade que nunca consegui suprir, enquanto o dia se fazia lá embaixo. Apenas ouvia os carros. Alí, tudo pedia um soundtrack, uma melodia de tema. Mas não, apenas quis ouvir o dia monótono que estava por vir. O apartamento, então pequeno, agigantou, bem como em todos os dias que a solidão vinha fazer sala. Nessas horas de sobra de reflexão, me peguei traçando o gráfico da minha caminhada. Mais parecia uma função do segundo grau, em que o ponto máximo era exatamente aquele dia, meus vinte e cinco. A partir dali, tudo seria decrescente. Ao que dizem, a queda é mais rápida que a subida. Interessante que bem no parabéns renegado e no feliz aniversário que rejeitei, eu estaria entre os planos da vida em diante, dos dias após os vinte e cinco. Logo chegaria os vinte-e-cinco-e-um-dia, e tudo seria decrescente. Muito sempre me admirou o festejo tão intenso e fanático à vida que pessoas comuns se prestam a vida inteira. Às vezes penso ser uma auto compensação às frustrações que se acumulam pouco a pouco e, no fim, o prazer real vai ficando escasso. Eu já não me dou essa prerrogativa. Aliás, a única prerrogativa que me dei àquele dia foram o café morno e o baseado. E o barulho dos carros e dos meus pensamentos. Mas, principalmente, a luz branda do Sol que levantava, que em muito se assemelhava às manhãs da minha infância. Àquele dia, estava numa montanha russa, de mãos levantadas, preparadas para a descida. Porém, sem sustos ou solavancos, apenas a leve ansiedade para que tudo acabasse.

terça-feira, 4 de novembro de 2014



E ele pôs-se a rir do próprio reflexo no espelho. Percebi claramente que era a velha tentativa clichê de rir para não chorar. Pareceu-me dar-se conta do que era anos atrás. Arrisco a até dizer, categoricamente, que pensou que a criança que fora não se orgulharia daquele reflexo. Mas, para ele, graças aos Céus que crescera. Triste é a criança que entende o olhar exausto de um adulto. E ele, meu Deus, estava contando sempre um dia a menos nos calendários que se seguiram.