quarta-feira, 20 de março de 2013

Ao (des)amor da minha vida


É loucura depois de tanto tempo, eu vir te falar isso. Não sei nem se você vai ler, também acho bom não saber. De qualquer forma, valeu o desabafo.
Isso aqui, Luiz, é a última forma que eu encontrei de tentar apagar aquele setembro/outubro da minha cabeça. Faz um bom tempo, né? Pois é, e de lá pra cá, eu nunca deixei de me lembrar de ti, e isso começou a ser um problema pra mim. Certo que depois do nosso afastamento, a minha vida continuou. Conheci muita gente, até me envolvi, diga-se, mas você ainda perdurava na minha cabeça.
É, sem mais rodeios, eu gosto de você. É algo que eu realmente nunca entendi o porquê. Nesse tempo, você mudou muito, entrou na universidade que tanto almejava e hoje, é outro. Sem contar que a sua vaidade é um verdadeiro abismo entre mim, simplista, e ti, tão ambicioso. Além de tantas outras diferenças. Porém, nada em mim mudou, tudo continua intacto, infelizmente.
O que eu levo comigo é uma verdadeira charada. Tentei decifrar, dissecar, sufocar, matar. Mas é mais forte que toda a minha prepotência. Eu sinceramente me sinto um fraco por não ter controle sobre isso, por não ter o poder absoluto de controlar o meu coração assim como se controla um corcel. Ainda mais falando de ti, eu sou um verdadeiro fracassado. Todas as minhas tentativas foram falhas e essa, é a derradeira que me sobrou. Eu tô cansado, saca? Você não imagina o quanto é difícil lidar com sua indiferença. Sei que a vida muda, que os caminhos vêm e vão, mas é que, lamentavelmente, nada mudou pra mim. Cada vez que você me tratava com desprezo é como se me desse um murro no peito, e pra quem tá desarmado, a dor é maior. Você não é feito de pedra, já deve ter gostado de alguém, sabe do que eu tô falando, imagino. Mesmo assim, tentei várias reaproximações, todas elas falhas.
Meu cano de escape são pequenos textos. Já fiz tantos, mas não sei o número exato. Foi a forma de tentar reformular tudo e achar uma saída pra poder esquecer. Dentre eles, um dos últimos foi esse:

Eu queria ser assassino. Juro como queria. Porém, matar requer uma força congênita, talvez de nascença, talvez adquirida pelas intempéries da vida, ainda antes de se tirar a baba do queixo. Mas te mato na minha imaginação. 
Veja só, eu tentei te afastar da minha mente, tentei agredir a tua imagem quase intacta que insiste em se fincar a cada esquina. Tentei te ignorar, te apedrejar, te mutilar; tentei te tirar o oxigênio, mas percebi que estava no lugar errado: a imagem com a qual guerreio aqui em cima é apenas reflexo. Você não vive na minha cabeça, como julguei, onde tudo é embaralhado demais - você não passaria da primeira semana, quer apostar? -. Você vive mesmo é logo abaixo da garganta, entre o pulmão e a caixa torácica, e lá, meu amigo, eu não tenho plano de guerra; a geografia é maluca, não há física, química, não há lógica.

Mas não se engane, isso não é uma redenção. Já ouviu falar que a esperança é a única que morre? Pois é, pelo menos o alento de "ao menos eu tô tentando", o teu reflexo vai me dar. No mais, vou imaginando que um caminhão passou por cima de ti, tanto quanto nenhuma sorte seria capaz de te salvar.

Não leve a mal o exagero da agressividade, foi apenas a forma de expressar a minha frustração. Até por que, não te desejo mal algum. Muito pelo contrário, torço MUITO por ti. E continuarei torcendo, mas é hora de esquecer. Bem, não que te importe, mas isso aqui é uma despedida. Não vou mais te aborrecer com minhas tentativas tolas de reaproximação.
Sei que o mais provável é que você nem tenha se dado ao trabalho de ler. Tudo bem, como disse antes, o que eu queria era desabafar. A minha vida segue e para que eu possa aproveitar os novos caminhos, eu tenho que deixar isso pra trás.
Sei que parece loucura o que estou fazendo, me despindo de qualquer armadura e te entregando todo o sentimento que tenho guardado há tanto tempo por ti, mas volto a dizer que essa foi a minha última saída; a última tentativa de sepultar o que de bom eu vim cultivando no peito, mesmo que contra a vontade. Assim, posso te deixar em paz e seguir em paz.
Muita sorte na tua vida, Luiz Vilar, sei que você será um grande homem, e sei que ainda vou ouvir falar de ti... Só espero que seja daqui ao tempo suficiente para que tua lembrança não me atormente como hoje.

Adeus

domingo, 3 de março de 2013

O inadequado


– Eu só tenho a agradecer. – Disse, me afastando da bancada da mesa. A minha mochila já estava pronta, no sofá.
Ela estava parada, estática e apática, me olhando com veemência. Parecia ter ficado surpresa com a minha atitude brusca de ir embora, como se estivesse segura demais de que eu a necessitava mais que o contrário. A mão apoiada na cintura foi levada ao cabelo, arrumando alguma imperfeição fantasiosa, criada pelo impulso de nervosismo ao não saber o que  fazer naquele momento.
A demora para dizer alguma coisa só fez transparecer seu empasse, entre preservar o orgulho e assistir a tudo ser jogado no ralo, deixando intacta sua imagem de que tinha o que precisava e eu era uma mera carta a ser jogada fora do baralho, ou fazer uma última súplica, exprimindo a vontade de me ter por perto, nem que fosse para uma “escora” que a levantaria sempre que precisasse. Como eu sabia disso? Eu não sabia peremptoriamente, mas ela era dividida entre a emoção e o orgulho desde nascença. A popularidade não a ajudou, talvez até a tenha deixado vulnerável, como um cordeiro quando entra em terra de lobos. Mas não seria eu quem a avisaria. Na minha cabeça carregada de rancor, eu já tinha feito muito, e agora que as palavras que tanto esperei haviam sido cuspidas na minha cara, ela não era mais problema meu.
– Você entendeu errado... – Ensaiou uma tentativa patética de desculpas.
– Eu sabia que esse momento chegaria, e não tente zombar de minha inteligência, eu ouvi tudo. Mas eu sinceramente te agradeço, porque aprendi muito aqui. Mas é hora de partir. – Tentei dar as costas, contudo, ainda havia palavras correndo nas minhas veias:
– Não sem antes te prometer que você nunca mais sentirá minha “presença negativa”. Agora você e o resto dos seus – que um dia julguei serem meus também – se livrarão deste estorvo que é a minha companhia.
Segurei as lágrimas até atingir uma distância segura daquela casa, e até mais, pois tive medo de que alguém viesse atrás de mim. Mas ninguém veio, o que só ressalvava a desimportância que eu tinha para eles. Inconscientemente eu guardava a esperança de que alguém viria, pelo menos um deles. Nem que fosse para me acompanhar em silêncio até eu dobrar a esquina. Mas não, eu caminhei sozinho até a minha casa. E o caminho era longo demais para que aguentasse até o fim com as lágrimas presas nos olhos. Eram tão pesadas que senti que iria cair, inerte, no chão, quando a primeira delas rolou rosto abaixo. Mais uma vez eu estava a destruir tudo o que construíra durante tantos anos.
Fazia aquele caminho pela última vez, assim esperava. Apesar de sentir que aquela situação demasiada desagradável ocorreria a qualquer momento – e até clamava por ela, devido a angústia que me causava essa premunição – ouvir tudo aquilo de pessoas que tanto amei foram como adagas me dilacerando as entranhas. Me senti atingido no orgulho. Poucas palavras foram o suficiente para me rasgar de baixo à cima e o bastante para que eu apagasse de vez todas aquelas pessoas que tanto presei um dia.
Eles preferiam alguém que os fizesse rir a alguém que os segurasse a fidelidade. Preferiam bem mais quem soubesse falar o que seus ouvidos pediam, a alguém que entregasse a verdade como o melhor caminho. Preferiam quem se embriagasse com eles, ao invés de quem os cuidasse com todo carinho. Preferiam as montanhas de palavras vazias, ao silêncio inteligente de quando o menos é mais. Mas essa pessoa eu nunca poderia ser, nem se quisesse.
Aquela pista de paralelepípedos me fazia sangrar a cada tropeço. Eu estava jogado à lama, como um legume que não serve mais para o banquete e é lançado aos porcos. Mas nem no chiqueiro eu fazia sentido. Para quem estava sempre num ponto entre uma coisa e outra, nenhum lugar faria sentido. Eu estou entre o tolo e o inteligente, o louco e o são, o falante e o mudo, o agradável e o insuportável, entre homem e mulher, mas nunca na certeza de cada extremo. Como se o destino tivesse me expulsado de algum lugar tão longe quanto não se possa ver; e eu tivesse caído de paraquedas nesse mundo. Minha busca era por um lugar, talvez esteja aí o meu erro. Não passo de um vagante da solidão. Um incerto, um inconveniente, um inadequado.